quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Sarah VI


Todos continuavam a correr desesperados. Vozes misturavam-se no ar e perdiam o sentido. Meu pai continuava ao meu lado, com a mesma decisão de que não iria embora sem mim.
- Você não tem apenas a mim, pai. Há outros que precisam de você. Eu sei o que quero. Seria infeliz se fugisse com vocês. Estaria enganando a mim mesma. - Continuei a fitar as árvores e a escuridão à nossa frente. Meus braços estavam recostados na sacada do grande palácio em que os anjos se abrigavam. Não havia mais esperanças, não para mim.
- Se esta é sua decisão. Eu sinto por não poder fazer nada. - Tocou meu ombro. Eu apenas assenti com a cabeça, assegurando-o de que poderia partir. Tudo ficaria bem. Recebi um beijo seu na testa e senti sua partida. Eu sabia que havia feito a escolha certa, independente do que acontecesse.
Um homem alto e forte, com a pele branca como a neve, saiu de trás das árvores. O sol já havia se posto; só havia escuridão, por onde quer que eu olhasse. O homem correu em minha direção. Montado em um cavalo negro, com uma faca em uma das mãos.
Minha reação não poderia ser diferente. Senti medo, senti-me acuada. Abaixei-me atrás da sacada onde estava, mas sabia que o homem já havia me visto.
Ouviu-se um uivo estrondoso no floresta. Um arrepio percorreu meu corpo. E de repente, fez-se silêncio. Levantei a cabeça cuidadosamente, observando por cima da pedra fria da sacada. O homem no cavalo negro estava voltado para floresta, como se esperasse a chegada de alguém.
Seu objetivo não era destruir minha espécie? O que fazia parado que ainda não atacara? O que o impedia? Ainda havia alguns anjos vagando pelo palácio, procurando por outros perdidos, tentando salvá-los. Não fazia sentido.
Era ele. Saiu de trás das árvores, montado em outro cavalo negro. Ele estava diferente, outra vez. Sua pele não era tão pálida quanto antes, era quase corada, em comparação ao outro homem.
Fenriz também carregava uma espada em suas mãos, e a apontava para o outro homem. Com um uivo alto e forte, ele correu em direção ao homem. A espada pontiaguda, apontada em sua direção, pronta para entrar-lhe no peito. O homem, porém, já estava preparado. A luta começara. Ruídos de espadas e gemidos era o que se podia ouvir em meio aquela batalha. Eu nada entendia. Apenas zelava pela vida de Fenriz. Não seria justo que ele partisse.
O homem o atingiu no rosto. Fenriz estava caído na grama, sobre as folhas.
- Não! Fenriz. - Eu gritei, sem pensar nas consequências.
O homem virou-se em minha direção. Encarando-me com seus olhos negros e profundos. Com um olhar desconhecido, ele seguia até mim, já sem seu cavalo, caminhando sem pressa. Um sorriso brincava em seu rosto.
Enquanto isso, Fenriz levantava sorrateiramente e dirigia-se em direção a seu cavalo, com a faca nas mãos. Meu olhar amedrontado ainda não saía do outro homem, que estava agora a alguns passos de mim.
O homem parou. Com as mãos em seu ventre, sentiu o sangue escorrer pelos dedos. E, em poucos segundos, sua cabeça não pertencia mais a seu corpo.
Fenriz continuou com o cavalo em minha direção, e parou em baixo da sacada.
- Venha comigo, virão outros atrás de vocês. - Ele ofereceu-me a mão. Queria que eu pulasse no cavalo com ele.
Oscilei, decidindo se era o certo a fazer. Afinal, eu não o conhecia, apesar de meu coração afirmar o contrário. Meu coração pertencia a ele, como se sempre o esperasse.
- Confie em mim. Eu não machucaria você.
Foi o bastante para que eu colasse meu corpo ao seu. E saíssemos com o cabelo ao vento pela floresta.
- O que está acontecendo? Por que você o matou? Ele não é um -
- Eu não sou um deles. Eu não pertenço a este mundo, Sarah! - Ele me interrompeu. Surpreendendo-me por saber meu nome.
- Como você sabe meu nome? Eu não lembro... Não, eu não o disse a você. E espere, você não é um deles? - Milhões de perguntas rodeavam minha cabeça. Precisaria organizá-las para entender o que acontecia.
- Todos sabem seu nome. Sua mãe sofreu na mão de meu pai, você deve lembrar disso.
- Seu pai? Loki? E-eu não... - As palavras que saíam de minha boca não faziam sentido algum.
- Pensei que soubesse. Teremos tempo para conversar. Eu não sou um deles. Nós podemos escolher que caminho seguiremos, mas há apenas uma coisa que pode nos mudar para sempre.
- É por isso que seus olhos estão azuis e... Sua pele não parece tão branca quanto era antes. - Toquei seu braço descoberto. Apreciando a textura de sua pele.
- Você me salvou desse destino. Meu pai queria matá-la. Eles não aceitam que um de nós não queira seguir seu destino.
- Aquele era Loki? Você matou -
- Não, não. - Ele interrompeu. - Era apenas um de seus guerreiros. Mas meu pai virá atrás de nós. Não acredito, porém, que nos encontrará. Eu sou como era antes, ele não conseguirá me encontrar nessa nossa forma.
- Para onde estamos indo? - Questionei, Abraçando mais forte seu peito, quando a velocidade aumentou.
- Ainda não sei. Não se preocupe, estará salva comigo - Ele segurou uma de minhas mãos e a beijou delicadamente. - Você não sabe por quanto tempo esperei por você.
Não importava para onde iríamos. Eu estava ao seu lado, repousando na floresta, esperando que o novo dia chegasse para continuarmos nosso caminho. E eu estava a salvo, meu coração estava a salvo, e, pela primeira vez, preenchido.

Por Michele Penteado.
© direitos reservados a autora

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